sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Oh tempo, não, não voltes para trás!

Um ano de cancro. Sim, faz hoje um ano que me foi diagnosticado o linfoma.

Sempre tive queda para decorar datas (e números de telefone em particular, quem me conhece sabe bem), mas neste último ano esta minha característica acentuou-se. Já há várias semanas que me tem ocorrido pensamentos como "há, precisamente, um ano aconteceu isto, e isto e mais isto!".

Pois bem, há um ano atrás disseram-me: "A Margarida tem um linfoma".
Esta memória pareceu-me ser suficientemente relevante para me fazer voltar a escrever no blog e falar no assunto. Mais do que falar, refletir... Porque a pergunta impõe-se e é inevitável: o que mudou? 

Resposta: Tudo. Mudou tudo. Foi um virar do mundo ao contrário, foi um turbilhão de acontecimentos com muitas emoções à mistura. 

Não foi imediato, a ficha não caiu logo - só assim consigo explicar o facto de ter passado a tarde de 2 de Dezembro de 2015 numa esplanada a conviver com a minha mamã, o mano e alguns bons amigos que se fizeram à estrada para vir entregar um abraço. E depois deste dia, o qual consigo recapitular mentalmente ao pormenor, a ficha demorou a cair... 
Mas quando caiu, bolas, caiu a sério... 

Veio a revolta, tanta revolta! Vieram as dores dilacerantes do cancro que crescia, o tratamento e seus efeitos secundários, as limitações a que fiquei sujeita. Tudo isso gerou mais revolta, mais tristeza, mais dor, como se fosse uma bola de neve! 
Mas, calma, nem tudo foi desgraça... Na verdade saiu-me a sorte grande - o suporte, a estrutura familiar e a rede de amizades que tinha (e tenho), que me impedia (e impede) de ir ao fundo nos momentos mais difíceis, fortaleceu-se, de uma forma tão profunda que não tem preço. 

Sabem aquele jogo de fazer cadeirinha com os braços? Foi mais ou menos assim que funcionou. Sempre que a ameaça de afundar surgia, todos se organizavam, cruzavam os braços, davam as mãos e carregavam-me, levavam-me ao colo... E aos poucos, a confiança voltou a emergir, a esperança, a fé, a aceitação e, por fim, a paz, tomaram conta de mim. 
Acreditei que ia passar, e passou, como tudo na vida.

Mas as marcas ficam e por mais que a vida entre e regresse aos eixos, há sempre alterações no comportamento das pessoas que permanece. Ok, é tudo muito recente, mas os braços e as mãos que formavam a cadeirinha humana continuam cá e, ainda hoje, me amparam as quedas. 
O melhor de tudo é saber que vão permanecer, no matter what. E esta é a parte boa de passar pelas adversidades, pelas provas e rasteiras que a vida nos prega: descobrimos quem são os nossos amigos (com A grande), quem gosta verdadeiramente de nós, quem está e quer, genuinamente, estar ao nosso lado.

A Guida de hoje não é a Guida de há um ano. 
A Guida de hoje é uma mulher confiante, que sabe o que quer e, acima de tudo, o que não quer. 
A Guida de hoje não virou super-mulher, continua a ter, naturalmente, as suas fragilidades... Mas encara-as de forma diferente. 
A Guida de hoje tem dentro dela uma vontade imensa de ir, fazer e acontecer, de dar sem receber, só pelo prazer e satisfação de ser útil ao próximo. 
A Guida de hoje quer sonhar e alcançar, quer descobrir, experimentar, desafiar-se... 
A Guida de hoje quer VIVER, no verdadeiro sentido da palavra, como nunca se atreveu a querer.

Obrigada Sr. Cancro, por me teres acordado para a vida.

Afinal, não és doença, és cura!


domingo, 24 de julho de 2016

O último antes dos 30

Sem pensar muito no calor que se faria sentir hoje, decidi fazer uma caminhada da parte da manhã. Fui até ao Parque verde, local que não prescindo de ir sempre que estou em Coimbra. Ainda não ia a meio e já me arrependia, suponho que às 10 da manhã a temperatura já roçava os 30 graus! Mas nem por isso desisti, é urgente recuperar a forma física, da qual me tenho desleixado nos últimos tempos... 

Cheguei a casa uma hora e tal depois, desidratada e com uma bela dor de cabeça e de pernas! Recuperada do esforço, saio de casa à procura de um sítio calmo para retomar o estudo. Biblioteca, fechada. Faculdade de Economia, fechada. Tentei o TAGV na esperança de encontrar um local, pelo menos, fresco! Não fui feliz na minha escolha, estar dentro do café ou na esplanada da praça teria sido rigorosamente o mesmo. 

Que sorte a minha, um fim de semana de calor infernal, Coimbra deserta (porque está tudo na praia) e a Gui praticamente sozinha em casa e a estudar a esta altura do campeonato!

Se pudesse ao menos recuar uma semana no tempo...  Estava prestes a completar 29 anos!

Não tenho por hábito festejar o meu aniversário com muita gente, gosto muito de convívios e festas, quando são dos outros e por isso quase sempre torço o nariz à ideia de grandes jantares.
Este ano, devido a tudo o que aconteceu, decidi convidar uns amigos para beber um copo e cantar os parabéns à meia noite, nada de especial. 
No entanto, acharam que a ocasião pedia mais, meteram mãos à obra e fizeram, sem o meu conhecimento, o que eu não queria fazer: um grande jantar com a minha família e amigos mais próximos. 

Sem saber de nada ainda lhes dei luta porque insistia em sair da praia, onde estava a passar a tarde com alguns amigos, para ir para Felgueiras onde supostamente jantaria, somente, com os meus pais e avós. 

Os estratagemas para me atrasarem foram mais que muitos e eu não queria, de todo, atrasar-me porque, para além de ser perita nisso, não queria dar razão ao meu pai, que faz sempre questão que eu esteja em casa a horas!

Acho que pela primeira vez na vida, não levei um "puxão de orelhas" pelo meu atraso! 

À minha espera tinha uma pequena multidão, a lançar um "SURPRESA" assim que surgi no patamar. E que surpresa! 




Chorei, tremi, voltei a chorar e dei início à ronda de beijinhos e abraços aos presentes. Seguiu-se uma bela noite de convívio, onde só tive pena de não me poder multiplicar para dar a atenção devida a cada um.

Agradeço aos que vieram de longe, muito longe, para estarem comigo. 
Agradeço aos de perto por terem sido incansáveis nos preparativos e na criação de um cenário incrível. Agradeço, particularmente, à Pi por todo o trabalho que teve ao longo de semanas!
À Tess pelo registo fotográfico que vai virar um excelente álbum.
À minha avó que, atraiçoada tantas vezes pela memória, conseguiu não estragar a surpresa.
Aos meus pais, por terem tornado esta celebração memorável!

Aos poucos (mas bons) que faltaram, pelas mais diversas razões, não se preocupem, estiveram bem pertinho, no meu pensamento.

Para o ano há mais!!



E com este post me despeço do blog por uns tempos. 
Volto em Outubro, darei novidades quando voltar ao IPO. 
Está documentado o que havia para documentar. O pior já passou e desejo, com todas as minhas forças, que os dias difíceis e de luta tenham terminado. 
A resiliência, essa, pode permanecer, é uma boa ferramenta para a vida.


Um bem-haja a todos os que me acompanharam. 
Levo-vos no coração!


segunda-feira, 18 de julho de 2016

Milagre da Vida

Recebi a notícia da gravidez da Valéria (amiga de longa data - tantos anos que já lhes perdi a conta) num dos muitos dias que estive internada nos HUC. As minhas "roommates" já dormiam a sono solto quando fui surpreendida por aquela que foi a bomba do ano: A Val e o Luís Pedro vão ter um bebé!

Saltei da cama, fui para a sala de espera da ala de pneumologia e quis saber todos os pormenores deste acontecimento inesperado. Nessa noite tive dificuldade em adormecer, entre perplexidade e felicidade, a felicidade ganhou e acabei por adormecer com um sorriso nos lábios. É o milagre da vida, um bebé só pode significar e despoletar sentimentos positivos!



O tempo foi passando, obtive um diagnóstico, iniciei a quimioterapia... Nos intervalos dos tratamentos, saíamos para lanchar, para partilhar novidades. Foi um período de descobertas, de reflexões, de amadurecimento, de troca de ideias, de projeções para o futuro. O melhor destes encontros era poder ver a barriguinha da Val cada vez maior, era tocar-lhe e sentir o Luisinho mexer-se, era vê-la cada vez mais bonita e, acima de tudo, feliz.



O Luisinho deveria ter nascido no final de Junho. Mas o pequenote estava com preguiça e nunca mais nos dava o gosto de nascer. A certa altura a Val comenta comigo: "Guida, ficamos a saber da existência dele quando ficaste doente. Com jeitinho vai nascer no dia em que acabas os tratamentos!". Era ouro sobre azul! 

No dia em que acabei a radioterapia combinamos jantar com os nossos amigos para assistirmos juntos ao jogo da seleção e celebrar a minha vitória. Assim que cheguei ao restaurante encontrei a minha Val nervosa, rodeada de leques improvisados, e de saída para o hospital. O Luisinho ia nascer! E nasceu, na madrugada de 7 de Julho. Saudável, perfeito, com um narizinho a puxar o do pai! 

O meu dia tinha sido maravilhoso e não poderia ter tido um final mais feliz!
Apresento-vos o menino mais querido à face da terra, o nosso pequeno Luisinho!


Não me canso de contempla-lo e acredito que estou a desenvolver as minhas skills de tia emprestada. O que vem mesmo a calhar porque em breve vou ser tia pela segunda vez, já que a Sílvia está à espera de uma menina!

A Maria nasce em Novembro e estamos desejosos para a conhecer (desconfiamos que se o nariz do Luisinho é igual ao do pai, o nariz da Maria vai ser igual ao da mãe)


No início deste ano disseram-me que 2016 ia ser um grande ano para todos nós.

E não é que está a ser? 

quarta-feira, 6 de julho de 2016

It's over!!

Nem sei por onde começar... A euforia tomou conta de mim, de tal maneira que me impede de concentrar no estudo. Por isso decidi vir para a esplanada da praia, a praia onde cresci e de onde guardo as melhores recordações da minha infância. Sinto-me uma privilegiada, por poder voltar aos lugares onde sempre fui feliz, tão feliz! Sinto-me ainda mais privilegiada por estar viva, por sentir uma vontade imensa de aproveitar cada momento desta vida efémera e sinto essa vontade a fervilhar dentro de mim!



Hoje, dia 6 de Julho de 2016, acabou o meu tratamento. Acabou, acabou, acabou!! Não me canso de repetir isso ao telefone, apetece-me gritar para toda a praia ouvir, que hoje, dia 6 de Julho é dia de alegria, é dia de comemorar o fim da pior fase da minha vida.

Foram 240 dias, dias de angústia, sofrimento físico e emocional, dias difíceis, alguns demasiados difíceis para uma jovem de quase 29 anos com muitos projetos, muitos sonhos e muita vontade de os concretizar... Estou tão feliz que não caibo em mim! Já chorei, muito, já ri, muito também. Ainda nem acredito que isto acabou, que vou finalmente poder continuar aquilo que ficou, como costumo dizer, suspenso!

Foram 6 ciclos de quimioterapia, seguidos de 22 sessões de radioterapia. Inicialmente estavam previstas 20, mas como o meu corpo começou a responder tão bem ao tratamento, decidiram fazer mais duas sessões, limitadas apenas à área residual que se observava nitidamente nas imagens, para “potenciar o tratamento”.





 O facto de o meu corpo responder tao bem levou os médicos a crer que, ao contrário do que foi revelado na última biopsia que fiz, ainda havia alguma malignidade. Ou seja, se fosse material benigno as alterações não teriam sido tão acentuadas. O material recolhido na amostra não terá sido representativo da massa total e por isso não revelou malignidade. Mas isso agora também não interessa para nada, porque afinal o linfoma está mais que morto, assim o espero!

E agora, o que sucede? Consultas de seguimento, análises... Mas isso será só em Outubro. Sim, só em Outubro volto a por os pés no IPO, e só em Janeiro poderei fazer o exame que vai ditar o juízo final. Para já está a batalha ganha, mas a derradeira vitória ainda está por vir. Com a força que tenho em mim, sei que chegará.



Nesse dia vou querer festejar com todos, todos aqueles que desde o primeiro minuto estiveram ao meu lado. Sinto-me grata, tão grata à vida por me presentear com tantos e bons amigos, por me mostrar o melhor lado deles, por me proporcionar amor, amizade, carinho, solidadriedade, palavras e abraços de conforto. Sinto-me ainda mais grata por ter uma família incrível, que me deu a mão sem nunca a largar, que chorou comigo quando eu precisei de chorar, que esteve sempre à cabeceira da minha cama tentando amenizar o meu sofrimento, as dores que tantas vezes me assolaram o peito. A todos vós, mais ou menos próximos no parentesco, um obrigada é pouco, muito pouco.

Pedro... Tu, que com o teu jeito tão particular, me abraçavas e me transmitias a paz necessária para enfrentar cada momento. Que num sorriso me devolvias a esperança, e num olhar a certeza de que tudo ia ficar bem. E ficou, agora vamos aproveitar a bonança, a nossa tempestade está a passar!



Por fim, não consigo deixar de agradecer a todos os profissionais de saúde com quem contactei. Provavelmente a maior parte não vai ler o meu blog pois nem todos tem conhecimento dele. Mas seria injusto não “dedicar” esta pequena grande vitória a cada um deles. O que seriamos nós, doentes e pacientes, sem o profissionalismo, rigor e carinho com que nos tratam.

Agora que já exteriorizei a minha alegria e entusiasmo, já me sinto mais serena e talvez já consiga concentrar-me na Bioquímica Clínica que me anda a dar cabo dos neurónios!

Mais logo vou celebrar, o término dos tratamentos, o aniversário da Lili (pensavas que escapavas?), a existência do Luisinho que teima em permanecer na barriga da Val e, quem sabe, a passagem de Portugal à final!
Mas antes, vou descalçar-me, arregaçar as calças e vou sentir o mar.



Hoje é o primeiro dia do resto desta aventura a que chamamos VIDA!



quarta-feira, 8 de junho de 2016

Hoje pela Mafalda, amanhã por cada um de nós!

Hoje vou usar este blog não para contar a minha história mas vos dar a conhecer a história da Mafalda. Uma história que não é a minha mas poderia perfeitamente ser. Aliás, podia ser a história de qualquer um de nós. Porque os azares não acontecem só aos outros, não é assim?

A Mafalda teve um linfoma aos 22 anos, quando estava a terminar a sua licenciatura. Formou-se em Matemática e tive o privilégio de ter tido a sua ajuda nessa matéria que foi sempre o meu calcanhar de aquiles! Há algum tempo atrás, depois de ter o seu segundo filho e já a realizar o doutoramento (que não pôde concluir), surgiu outro linfoma, de um sub-tipo diferente. Foi internada vezes sem conta, foi sujeita a uma quimioterapia muito intensiva... Com uma força inimaginável, voltou a vencer a doença. 

No entanto, as limitações são muitas, o corpo não é de ferro! Neste momento a Mafalda está a trabalhar a 100%, contra a vontade dos médicos. Gostaria de poder ver o seu horário de trabalho reduzido, em proporção às suas limitações. 
Procurou uma forma de o conseguir, mas no nosso país tal não é possível. Ou trabalha a 100% ou está de baixa. 

Optando pela baixa médica, não será injusto o contribuinte pagar para uma pessoa, que tem alguma capacidade para trabalhar, estar em casa a receber até, salvo erro, 80% do seu salário? 

Não será igualmente injusto uma pessoa querer trabalhar, apesar da sua incapacidade, e não poder ver o seu horário reduzido, de acordo com a % de incapacidade atribuída? 

Não deveria ser esta uma medida contemplada no conjunto de benefícios dados a quem é atribuída 60% de incapacidade decretada por junta médica? 

Não ficará o estado (e o contribuinte) a perder promovendo a atribuição de baixas médicas em vez de incentivar a inclusão de cidadãos portadores de incapacidade, sem redução de remuneração, no mercado de trabalho?

A Mafalda tem sido notícia em várias revistas/jornais, dá a cara por todos nós, numa luta que hoje é dela mas amanhã poderá ser a nossa.  
Vamos ajudá-la?

Deixo o link para a petição, aqui.






terça-feira, 7 de junho de 2016

Dar cabo do Barrabás - Parte 2

Começou a radioterapia.
Depois das voltas e reviravoltas que esta história deu, começou finalmente a segunda parte do tratamento. Já tinha tido uma consulta de radio-oncologia, logo depois de ter terminado a quimioterapia. Nessa consulta fiquei a conhecer a minha médica da radio, também ela, à semelhança da Dra Ilídia, uma querida. Explicou-me em que consistia o tratamento e falou-me dos efeitos secundários. 

A curto prazo podem surgir alguns efeitos localizados, resultantes da agressão dos tecidos irradiados. Tendo em conta que o alvo é a zona torácica, pode surgir inflamação do esófago o que, por sua vez, pode provocar dor, dificuldade e desconforto ao ingerir alimentos, bem como náuseas, e em casos extremos, vómitos. Outro efeito frequente da radioterapia (seja em que local for) são as queimaduras na pele... E para isso só há um remédio, proteger e hidratar. Isto significa duas coisas: a primeira é que posso esquecer os banhos de sol este verão e a segunda é que vou gastar uns bons euros em Biafine, Nívea e protetor solar 50+. É que para além da queimadura que, eventualmente, possa acontecer, há uma pele sensibilizada pela quimioterapia... 
Cansaço, diminuição dos glóbulos brancos, são outras reações que podem ocorrer e que desaparecem com a cessação do tratamento.

A longo prazo é que a porca torce o rabo. Por mais avançada que esteja a Medicina, por muito que calculem, ao milímetro, o local de incidência da radiação, não há por onde fugir: as radiações atingem não só os tumores mas também os tecidos circundantes. Quer isto dizer que, no meu caso, os pulmões, coração, tiróide, mama, tubo digestivo e pele são também afetados pelas radiações. De uma forma muito simplista, a radiação provoca alterações nas células que, um dia mais tarde, podem transformar-se em... células malignas! A longo prazo, o risco de aparecimento de outro cancro nestes tecidos é maior para mim do que para um indivíduo saudável. Certamente, o benefício da radioterapia compensa este risco, caso contrário não seria uma opção. E, apesar de tudo, não deixa de ser um risco... Pode acontecer ou não!

Depois de uma longa conversa com a Dra Carla, fui encaminhada para a sala de tac, para fazer a marcação da área a ser irradiada. Como a radioterapia é um tratamento de várias sessões, opta-se por uma marcação permanente para que, todos os dias, a radiação incida no mesmo local. Ou seja, fizeram-me umas mini tatuagens, 4 pontinhos, 2 na zona axilar e outros 2 junto ao esterno. Quase não se notam e por isso não me aflige que sejam para toda a vida!

Depois desta consulta passaram-se muitas semanas e ontem, 6/6/16, lá voltei ao IPO para ter consulta e tratamento. Na consulta fiquei a saber todos os cuidados a ter nesta fase, o que posso ou não fazer (nada de piscinas, mesmo que esteja um calor abrasador e que essa pareça a única solução!), e o mais importante de tudo, o número de sessões. Vão ser 20, 5 dias por semana, à excepção da semana do S. João, porque vão todos para o bailarico no dia 23! Sendo assim, até dia 4 de Julho vou ter de ir ao IPO quase todos os dias... 
Para compensar esta canseira, os tratamentos são muito rápidos. O tempo de espera é curto, ao fim de cerca de 10 minutos entramos para o vestiário e de lá passamos para a sala de tratamento. À nossa espera estão sempre duas terapeutas cuja função é deitar-me na maca e colocar o meu corpo na posição certa, com ajuda de um molde onde encaixa a cabeça e braços. Este alinhamento demora tanto tempo como o próprio tratamento. Empurram de um lado, puxam de outro e quando finalmente estão os 4 pontos acertados, saem da sala e ficam a ver-me por um ecrã enquanto o aparelho da radiação anda à minha volta. 

Não há nada como ver com os nossos próprios olhos e este é o acelerador linear, o aparelho que emite a radiação.

Duas moedinhas, duas voltinhas e estou pronta para me ir embora! 

O tratamento é totalmente indolor, não causa qualquer tipo de reação de calor ou de vibração. Ah, e também não se fica radioativo como na PET, por isso posso estar com grávidas e crianças à vontade, não represento nenhum risco para os outros. E ainda bem,
porque os meus primeiros "sobrinhos" estão a caminho! :D

Ao fim de meia hora já estou fora do IPO e faço aquela contagem decrescente... Já só faltam 18 sessões!

Para já não sinto qualquer efeito do tratamento, mas também é muito cedo para isso, penso. Daqui a uma semana tenho consulta, para a médica ir acompanhando o processo. Até lá vou estudando (os exames na faculdade estão aí à porta) e vou aproveitar o verão que, finalmente, chegou! 




sábado, 14 de maio de 2016

Guida 7 - 0 Barrabás

As boas notícias caem sempre bem, mas quando são inesperadas caem ainda melhor.

Na quinta-feira recebi uma chamada do IPO. Fico com o coração aos saltos sempre que vejo aquele número a aparecer no ecrã do meu telemóvel. Do lado de lá surge a voz da Dra Ilídia. Diz-me que, se bem me conhece, estou ansiosa para saber o resultado da biópsia e por isso me estava a ligar.

"Já temos o resultado do exame e, tal como esperávamos, aquilo que aparecia no PET não é mais do que parênquima necrótico". Trocando por miúdos, não é linfoma, são um conjunto de células mortas acumuladas no local que continua a "pintar" a fotografia mas que não constituem doença ou perigo. De repente, um peso gigante sai de cima dos ombros, que alívio!

Depois de mil e uma perguntas da minha parte, lá desligo o telefone, cada vez mais com a certeza de que estou nas melhores mãos. Nas mãos de uma equipa de médicos extraordinária, atentos, dedicados e sensíveis como poucos.

Agora siga para a radioterapia, que já se faz tarde! 
Esta semana vão marcar uma consulta e em breve iniciarei a segunda fase de tratamento. Um tratamento que em nada se compara à quimioterapia. Com os seus aspetos negativos, porque é sempre um procedimento agressivo, mas sem comparação.

Confesso que uma das coisas que mais me fazia confusão nos últimos tempos era o facto de, se tivesse de voltar à quimioterapia, o cabelo me voltar a cair novamente. Ando obcecada por ele, sempre de volta do espelho a tentar encontrar as diferenças que acontecem de dia para dia. Pergunto, constantemente, às pessoas se notam diferença e fico feliz quando me dizem que até me fica bem assim. Se cresce liso ou encaracolado, não interessa, só quero que cresça! Estou farta de não o ter, porque, quer queiramos quer não, é parte da nossa identidade. Estou cansada de andar sempre com os lenços atrás de mim, fazem calor e nem sempre combinam com o que queremos vestir... Mais um pequeno drama (ou não)!



O que realmente importa no meio disto tudo é que dei mais um passo em frente.
Vejo a luz ao fundo do túnel.
Cada vez mais forte e brilhante!




quarta-feira, 11 de maio de 2016

Força, Foco, Fé


O dia de hoje foi bem diferente do habitual. Foi um dia de paz, de reflexão e de uma certa emoção.

A Mimi, minha amiga desde a adolescência, tinha a promessa de ir a Fátima a pé. Na semana passada começou a sua peregrinação mas foi, infelizmente, atraiçoada por uma tendidnite, que a impediu de terminar a caminhada. Ao fim de 70 km viu-se obrigada a abandonar o grupo e voltar para casa. No entanto, não deixou de visitar o Santuário e fê-lo hoje, dia em que o grupo em que estava inserida chegaria ao destino. Convidou-me a acompanhá-la e juntamo-nos assim, no Santuário de Fátima, aos muitos peregrinos que alcançaram a meta. 

Fiquei comovida ao vê-los chegar. Abraçam-se, riem, mas a maior parte chora, felizes por terem ultrapassado as dificuldades de uma peregrinação tão longa.
Deixei-me invadir pela sua alegria, pela força que emanava daquele grupo, um sentimento difícil de descrever. 

A certo ponto fui surpreendida por uma das peregrinas, minha conhecida e amiga, que me ofereceu o terço que a acompanhou durante os mais de 200 Km que percorreu. Por ser especial, vou guardá-lo com todo o carinho, vou estimá-lo e vou voltar a Fátima com ele. Porque hoje chegamos de carro mas um dia chegaremos pelos nossos próprios pés. 
Não é assim, Mimi?


domingo, 8 de maio de 2016

Digressão nacional

A prova de que, realmente, ando a falhar com este blog é o facto de estar em frente ao computador há uns bons minutos à procura das palavras certas para começar este post. Por não me querer tornar repetitiva as palavras custam a sair. Costumam dizer que o difícil é começar. E com isto já escrevi umas linhas.

Há duas razões essenciais pelas quais tenho estado ausente. A primeira é que não tem havido grande evolução no meu tratamento. 
No início desta semana fui ao IPO fazer uma biópsia. Aquela que era a solução menos provável concretizou-se. Antes de fazerem opções erradas, os médicos decidiram que seria mais sensato tentar chegar ao cerne da questão, à massa de células que permaneceu após a quimioterapia, retirar uma amostra e estuda-la. Uma vez que eu não apresentava sinais clínicos da doença, o objetivo desta biopsia alterou-se: o resultado dela vai servir para ajustar a dose da radioterapia, sendo que a hipótese de voltar à quimioterapia é, praticamente, remota (ainda que não tenha saído da mesa por completo). 

Segundo a Dra Ilídia, a quimio já fez o que tinha a fazer. O que restou há-de ser eliminado pela radioterapia.  Posto isto, e bastante contrariada, lá fui fazer o exame. Antes de assinar o papelinho, coisa que só acontece quando os procedimentos apresentam alguns riscos, pedi, encarecidamente, por uma anestesia para além da anestesia local, qualquer coisa que me pusesse a dormir. Sob pena de ter de fazer a biopsia noutro dia lá aceitei um comprimido para me ajudar a relaxar e fiz a biopsia bem acordada! Bastou-me olhar para o tabuleiro dos instrumentos do médico para ficar uma pilha, aquela agulha tem um tamanho assustador. E pensar que vai ser espetada no peito é aterrador! 
Ao fim de 20 minutos estava já na maca, a receber paracetamol diretamente na veia para não ter dores quando a anestesia local passasse e a chorar como uma Madalena arrependida. Duas horas de repouso, um raio-x ao tórax e fujo, a 7 pés, daqueles carniceiros! 
Não foi tão mau como da outra vez, é certo, mas espero, fervorosamente, que tenha sido a última!

Fui embora com a indicação de repousar, nada de esforços até ao dia seguinte.  Depois é fazer a vida normal. E foi o que eu fiz. A partir daí resolvi praticar o “vá para fora cá dentro” com alguma intensidade e esta é a segunda e verdadeira razão pela qual não pus cá os pés. 

Do Porto segui para Vila do Conde e de lá para Lisboa. No regresso ao Norte decidi fazer uma visita relâmpago a Coimbra... É mais forte do que eu! 
A minha casa, as minhas colegas de casa (mais amigas que colegas), receberam-me de braços abertos como sempre. A mim e à minha tropa! E lá fomos cumprir a tradição, com chuva ou sem chuva, estudante que é estudante não falha uma queima das fitas! 
A esta altura devem achar que sou doida, mas a verdade é que me sinto ótima, com as energias lá no alto. E, não havendo nenhuma restrição médica, não havia razão para não ir, se era essa a minha vontade. Revi muitos amigos, choveram abraços e algumas lágrimas de alegria de ambas as partes. Em menos de 24 horas estava a bordo de mais um autocarro, desta vez em direção ao Porto. De coração apertado, porque soube a pouco, mas de alma cheia, porque voltar a Coimbra é sempre um gosto. Reconheço que já chega de queimas... Mas voltar também foi bom por isso, para me dar essa percepção.

Chego ao Porto debaixo de uma chuva que não dava tréguas e sigo com a Pi em direção a Vila Real. Fomos festejar o “último dos vintes” da minha amiga Raquel, e rever os nossos amigos transmontanos, que conhecemos, claro está, em Coimbra! Na volta, o túnel do Marão abriu alas para a nossa passagem, cruzamo-nos com a comitiva do governo e dissemos adeus ao Sócrates... Vá,  agora estou a inventar!

A azáfama de viagens terminou, ufa!


Volto à base mas tenho o pensamento noutra cidade e no passado, num tempo que foi e não volta. O meu facebook foi invadido por estudantes que se recusam a adiar cortejos académicos devido às condições meteorológicas. Era minha vontade ir ao sótão, sacudir o pó ao traje e sair para as ruas de Coimbra, de cartola roxa e bengala em punho. Afinal sempre foi o curso que quis fazer e era suposto terminá-lo agora. Por alguma razão, que só alguma entidade divina será conhecedora, não foi assim que aconteceu. 
E hoje, numa vila junto ao mar, bem longe de Coimbra, sou invadida por uma nostalgia, uma mágoa, uma revolta e muitas incertezas. Mas deixo que a maresia e o mar revolto me levem esses sentimentos para bem longe.  Aceito o que a vida me deu e convenço-me que o futuro me trará a recompensa. 
Já diz a música, "hoje é o primeiro dia do resto da tua vida". Está na hora de assentar arraiais, planear o estudo e trabalhar no que está ao ao meu alcance para continuar o meu percurso. Hoje, junto ao mar, decidi que não vou só vencer o cancro, mas vou também vencer na vida. 

Lamechices à parte, digo-vos, “um dia ainda me vou rir disto”!

sexta-feira, 22 de abril de 2016

Celebrar a vida!!

Porque hoje estás de parabéns, porque toda esta caminhada não faria sentido se não estivesses ao meu lado, e porque és a melhor mãe do mundo!
Obrigada por me continuares a dar o melhor colinho (apesar dos meus 28 anos) e por nunca largares a minha mão, especialmente agora, nesta "curva apertada da vida".







Sei que vais odiar estas fotografias, mas não te chateies comigo, o tempo não deu para mais.
Aos meus olhos és bonita sempre e de qualquer maneira!

Feliz aniversário mamã!

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Ufa!!

Depois do meu último post, do fim de semana em Lisboa e do regresso ao Norte, a ideia era passar por cá, com calma, e contar as últimas novidades. No entanto, fui surpreendida por um imprevisto... Chamemos-lhe acidente de percurso. Mas o melhor é começar do início.

Uns dias depois do último ciclo de quimioterapia, recebi a notificação para a consulta de radioterapia. Sabia que não poderia fazer radio antes de fazer exames médicos que verificassem o estado do "bicho" e facilmente percebi que seria uma consulta onde me seria explicado como se processa o tratamento. Tal como previa, a médica que me recebeu explicou-me tim-tim por tim-tim todo o processo, marcou-me os tais exames (PET e mais um exame para avaliar a função cardíaca pós quimio) e a próxima consulta de radio, que se pretendia fazer coincidir com o primeiro dia de tratamento. 
Esse dia seria hoje, quarta-feira, dia 20.

No início da semana passada, andava eu feliz e contente na minha vidinha, quando me ligam do IPO a marcar uma consulta com a Dra Ilídia, a minha "médica da quimio", como costumo dizer. Uma consulta completamente inesperada, uma consulta urgente. 
A partir deste momento senti tudo a desmoronar... Era óbvio que algo tinha corrido mal. Fiquei profundamente decepcionada, como se o meu esforço para preservar a coragem, a minha luta, tivesse sido em vão.
Como tinha realizado análises ao sangue no dia em que fiz um dos exames pedidos pela "médica da radio", não compreendi a razão pela qual a Dra Ilídia tinha pedido para realizar mais análises, com apenas 4 dias de diferença. Este facto suscitou-me ainda mais dúvidas e decidi contactá-la no dia seguinte, via telefone. Chamada para trás, chamada para a frente, lá consegui que atendesse. A nossa conversa foi breve, mas longa o suficiente para eu perceber a gravidade da situação: a PET deu um resultado menos bom, o meu caso precisava de uma re-avaliação e ela precisava de me examinar e conversar um pouco comigo. Perguntei-lhe, com a voz embargada, se existia a possibilidade de voltar a fazer quimio... Não me disse que sim nem que não, só que precisava que lá estivesse na sexta, de preferência a tempo de repetir as análises.

Se nesse momento senti uma espécie de alívio, por ter obtido informação mais concreta, no momento seguinte voltei a ficar agoniada. Foi um soco, um murro no estômago. A nossa conversa caiu-me tão mal... foi como se me tivessem dito "tens outro cancro e voltamos à estaca zero". Os dias que se seguiram foram péssimos. Penso que a minha preocupação, ansiedade, angústia estava estampada no meu rosto, na minha voz e por isso isolei-me, não atendi telefones, não respondi a mensagens... A véspera da consulta foi o culminar de todo o stress. Apercebi-me de como esse estado é prejudicial para a minha saúde, mental e física, e como acentua o desequilíbrio que já existe. Valeram-me os anjinhos de sempre! 

O tempo nunca passou tão devagar... Mas a hora H chegou e há que enfrentar o touro pelos cornos! A consulta que estava marcada para as 11 da manhã aconteceu quase às 2 da tarde. Sim, 3 horas de atraso! Oh sorte!!

Finalmente fiquei a saber o que realmente se passava. O resultado da PET era semelhante ao resultado que obtivemos ao fim de 4 ciclos, só que desta vez o sinal era mais intenso, o que, à partida, significaria mais atividade tumoral. No entanto, a probabilidade de ser um falso positivo é grande, ou seja, há sinal mas esse sinal pode dever-se a outra coisa que não a doença (à inflamação no local devido à morte das células malignas, por exemplo). Chegando a este ponto, há uma questão que se impõe: como podemos ter a certeza se ainda é, ou não, doença? A certeza absoluta só poderia ser dada por uma biópsia. Mas fazer uma biópsia nesta altura, em que o linfoma já está tão pequeno, é muito difícil (já foi inconclusivo quando ele tinha 11 cm). 
Essa hipótese não fica excluída mas é aqui que se torna evidente a importância de ser vista pela médica. Ela precisava de me ver e examinar para tirar a prova dos nove. Se eu tivesse chegado lá a dizer que estava mal, que tinha este e aquele sintoma e que não andava bem, a médica poderia facilmente concluir que a doença persistia e continuava a causar mossa. Como cheguei lá toda "fresca", a dizer que já me tinha inscrito no ginásio, que já corria 15 minutos seguidos e que andava mesmo bem disposta, então o caso muda de figura. São bons sinais, bons indicadores.
Depois de muitas perguntas, muitas notas tiradas, mandou-me fazer um raio x antes de me ir embora. No dia da reunião de grupo, vários médicos vão analisar o resultado dos vários exames e vão decidir que caminho vamos seguir: radioterapia, continuação da quimioterapia, ou biópsia.

Quando saí daquele consultório senti que me saiu um grande peso dos ombros. A mim, à minha mãe e ao meu pai, que me acompanharam na consulta. A todos os que estavam a par da situação. Afinal nem tudo era tão negro como pensávamos.

A reunião de grupo aconteceu hoje, dia 20. Penso que ainda esta semana será marcada alguma consulta. Com a médica da radio, ou com a médica da quimio, logo se verá!

Até lá, continuarei na minha vidinha, vidinha de quem está a recuperar aquilo que há uns tempos estava suspenso. 

O cabelo começou a crescer (muito fininho), as sobrancelhas e as pestanas, que quase desapareceram, voltaram. As unhas, que se tornaram escuras durante o tratamento, recuperam a sua cor. Aquele inchaço generalizado provocado pelos medicamentos, diminuiu. Sinto-me mais leve, sinto-me cheia de energia, pronta para abraçar a vida como nunca abracei. Afinal já passaram 6 semanas desde a última quimio!