terça-feira, 17 de outubro de 2017

THE LAST BUT NOT THE LEAST

Como perfeccionista assumida não gosto de deixar nada mal feito ou inacabado. Há muito, mesmo muito tempo que penso em passar por cá, ir publicando qualquer coisa para não deixar o blogue morrer. A vida tem-me mostrado que (quase) tudo tem um início, um meio e um fim. Independentemente da duração das diferentes fases, o fim é inevitável. Contudo, os fins não representam necessariamente a morte nem devem ser necessariamente encarados como algo negativo. Podem, simplesmente, significar o início de um novo ciclo, um recomeço, uma nova vida, vidas e realidades que podem coexistir em tempos e espaços diferentes. 

Depois de muito tempo sem escrever, senti que deveria fazer o derradeiro post. Por tudo o que este blogue significou para mim, por todas as pessoas que me foram seguindo através dele, pelas pontes e laços que me permitiu criar ao longo de toda esta jornada. Seria falta de brio da minha parte deixar este espaço ao abandono. 

Mas antes de o fazer, não posso deixar de resumir aqueles que foram os últimos 10 meses deste ano.
Ora então... No início de Janeiro, depois de, finalmente, terminar todos os exames da faculdade (finalmente fiz Química Orgânica II, yeah!), mudei-me para o Porto onde comecei a estagiar numa farmácia. Seguir o caminho mais fácil não é uma coisa que me assiste, já todos devem ter percebido. Mas desta vez, a ânsia de terminar este segundo curso (11 anos na faculdade, caramba) falou mais alto e optar por fazer estágio de 6 meses só na área de farmácia comunitária revelou-se a solução mais rápida para atingir o meu objetivo. Podia acabar o estágio em Junho, defender em Julho, tirar umas férias e relaxada, dar início ao processo de procura de emprego. 

Só que não... Ao longo dos 6 meses de estágio, na Farmácia do Bessa, onde fui tão bem recebida e integrada, fui percebendo que a minha cabeça não me permitia fazer 8 horas de estágio, que é como quem diz trabalho, sempre em pé, e chegar a casa e continuar a trabalhar, ora relatório de estágio, ora monografia. Não, não estava a aguentar. Depois de muitas mudanças de estratégia, de muitas lutas interiores e de alguma frustração, percebi e aceitei que o meu corpo não dava para mais e a minha cabeça não aguentava. E como perfeccionista que sou resolvi fazer uma coisa de cada vez: primeiro o estágio, com calma, e depois o relatório + monografia. Afinal podia sempre entregar e defender em Setembro... Com isto, o meu plano inicial de me tornar farmacêutica no início de Julho, antes de completar 30 anos de idade, saiu completamente ao lado! 

Terminei o estágio no final de Junho. Pelo meio, fui de Coimbra a Fátima a pé, rebentei-me toda (perdão pelo termo), vi o Santo Papa, rezei, respirei e libertei as minhas mágoas naquele espaço sagrado. 

Deixei o Porto, a casinha acolhedora da minha amiga Joana, o meu quarto azul, e enfiei-me na minha querida província, Julho e Agosto, a escrever... Não foi o melhor verão do mundo mas foi o que se arranjou!

O stress apoderou-se de mim, ter uma data de entrega estipulada, ver o tempo a passar, mil e um artigos sobre HIV na gravidez para ler, resumir e sintetizar informação e juntar tudo a 20 e tal páginas de relatório de estágio estava a deixar-me louca! Um documento final de 50 páginas para apresentar publicamente na faculdade em 20 minutos, aliado às mais diversas situações do quotidiano que iam surgindo e que me consumiam, deixando-me exausta, tornaram o meu dia a dia uma roda viva! 

A meio de agosto, sem jogar na lotaria, saiu-me a sorte grande. Do nada, um amigo abordou-me acerca da possibilidade de ir a uma entrevista a uma farmácia em Lisboa onde ele tinha começado a trabalhar. Achei que não perdia nada para além do meu precioso tempo e lá fui eu, só para ver como estas coisas de entrevistas de emprego funcionam. Num dia estava em Lisboa para ser entrevistada, no dia seguinte acordo com a chamada da Diretora Técnica da Farmácia do Colombo a perguntar-me quando poderia começar. 

Assim. Do céu cai-me um emprego, sem ter terminado o curso e sem ter feito uma única pesquisa no google sobre ofertas de emprego.

Já transpirava ansiedade por todos os lados... Depois disto, só deitava as mãos à cabeça. Mas como sempre, a minha família e amigos não me deixam ir ao fundo e com a ajuda de todos terminei a tese que não é tese mas é parecido, whatever.  No dia 1 de Setembro fui a Coimbra imprimir tudo, voltei a Felgueiras para fazer as malas, dia 2 mudei-me para Lisboa e no dia 4 às 9 da manhã estava a entrar no meu posto de trabalho. Uma cidade diferente, uma casa nova, pessoas novas, tudo novo aliado a um ritmo de trabalho alucinante e 360 Km de distância da minha Home Sweet home!

No dia 18 de Setembro, entre a saga de me apresentar, decentemente, no casamento de uma das minhas maiores amigas e apresentar, decentemente, o meu trabalho aos membros do júri, lá consegui safar-me! Escusado será dizer que perdi uns bons quilos, andava com umas olheiras até ao umbigo e quase caía para o lado com tanto cansaço! 

Mas sobrevivi e depois de 7 anos, repletos dos melhores e piores momentos da minha vida, sou, oficialmente mestre em Ciências Farmacêuticas!

Agora sim, posso realizar o meu sonho de criança, armar-me em Dra Carneira e Maria Micá e perguntar, por detrás do balcão da farmácia, com toda a convicção do mundo: "Quer um produto químico, natural ou assim-assim?" 


Agora é tempo de seguir. Fechou-se um ciclo, começa outro. Ainda não aprendi a lidar com o facto de não ter de estudar. Toda a vida estudei e digo muitas vezes que se pudesse, continuaria a fazê-lo. Mas por agora é tempo de acalmar. Arrumar os assuntos no lugar deles (a maior parte estão na minha cabecinha pensadora) e seguir em frente, relaxar e deixar que a vida aconteça.



Depois deste projeto furado de resumo, que demonstra a minha péssima capacidade de síntese e a importância que dou a cada pormenor, passo a explicar a razão de ter decidido colocar um ponto final neste blogue. Não é a morte dele, porque permanecerá disponível para quem tiver paciência e vontade  de saber a minha história. Mas é, definitivamente, o fim dele. A minha aventura no mundo do cancro não acabou, nem vai acabar nunca. A minha vida, o meu corpo, a minha personalidade e quiçá, a minha missão neste mundo ficarão para sempre marcados por este período de doença. Mas o que havia para contar está contado, porque a doença passou.

Daqui para a frente tenho, de 3 em 3 meses, consultas de rotina no IPO até perfazer os 5 anos de tratamento. Hoje, dia 16 de Outubro de 2017, foi dia de consulta com a Dra Ilídia. Antes disso, como é habitual e toda a gente sabe, faço análises ao sangue. Para variar chego tarde, enfrento a imensa sala de espera e respiro fundo antes de entrar para o gabinete de enfermagem. Passei a ter algum receio das agulhas que me espetam... O que antes era peanuts, agora dói, porque tenho alguns vasos sanguíneos impenetráveis como consequência da quimio. Mas também são só 4 vezes por ano, não há crise. A minha mãe sofre com isto... Diz que me torno transparente aos olhos dela. É uma descrição que me ultrapassa, porque não sou mãe e não atinjo a grandiosidade de tal sentimento. Um dia talvez o saiba. 
Segue-se o raio-x pelo qual implorei na última consulta. Já diz o ditado que gato escaldado de água fria tem medo e eu só quero fazer PET's e Raio-X para ter a certeza que o Barrabás morreu. Esse sim, tem o seu merecido fim.
A Dra Ilídia recebe-me com o sorriso cúmplice de sempre e diz-me que tenho o melhor raio x dos últimos 4 que fiz! Roda o ecrã do computador para mim e consigo ver a "cicatriz", o que restou do bicho de 12 cm reduzido a milímetros. As minhas análises estão impecáveis e levo um suave raspanete  por estar com baixo peso corporal e por não me alimentar como deve ser. Diz-me, entre risos, que tenho um problema de chupeta mal resolvido porque de vez em quando fumo uns cigarritos... É outro assunto a arrumar na gaveta cerebral quando a vida estabilizar mais um pouco. Até lá assumo os meus erros e consequências. Se tenho vergonha? Tenho. Mas esta sou eu, tal como sou, sem qualquer tipo de filtro ou escudo.

Saí do IPO com a alegria de sempre, a de viver. Fui passear um bocadinho com a minha mãe, apanhar ar e ver o mar. Revolto e a libertar o cheiro a maresia... Sinto-me renovada e de baterias carregadas!

Apanho o comboio para lisboa e entre uma boa soneca, um excelente livro e muita reflexão chego à estação de Santa Apolónia após 3 horas. Não me apeteceu apanhar o metro imediatamente e optei por caminhar até ao Terreiro do Paço. Há quanto tempo não passeio à noite por Lisboa? Apercebo-me dos contrastes, de um lado um barco de cruzeiro atracado, apinhado de turistas. Do outro lado da rua há uma carrinha de voluntariado a distribuir comida aos sem abrigo. Tenho de voltar ao voluntariado, está decidido. Continuo a caminhar, passo Alfama, observo os restaurantes típicos (a servir turistas), o museu do fado, o chafariz, o campo das cebolas que continua em obras... Vêm-me à memória uma série de recordações felizes de bons momentos que vivi nestes sítios, com pessoas diferentes, em momentos diferentes. Como gosto de Lisboa... Sinto-me, confortavelmente, em casa e fico contente com esse feeling. Conto pelos dedos os poucos lugares por onde passei e me fazem sentir assim.    Continuo a caminhar e deslumbro-me mais uma vez com a grandiosidade desta cidade. Não me canso.
Paro e penso. É urgente chegar ao equilíbrio, aquele que fica entre o conforto e o desafio. Tenho 30 anos e as rédeas foram-me devolvidas. Não me vou acomodar, não me vou deixar levar, só porque sim, só porque é mais fácil. Vou seguir o coração, vou deixar surpreender-me por aquilo que a vida tem para me dar, para o bem e para o mal.

Hoje disseram-me "cada viagem é uma viagem e há sempre coisas boas nelas. Às vezes não é preciso ir muito longe". Eu acrescento, citando o Nobel Saramago, "O fim duma viagem é apenas o começo doutra".

E assim me despeço. Com o coração cheio e com a certeza de que este caminho tortuoso valeu pelas coisas boas que me proporcionou, pela força que me trouxe e pela pessoa melhor que hoje sou.

Resta-me agradecer a todos os que me acompanharam, dia após dia, de longe ou de perto. 
Aos meus pais e ao meu irmão que são o que de mais sagrado tenho na vida.
À minha avó que, mais ou menos consciente da minha situação, nunca me deixou dormir sem se certificar de que estava confortável, deixando-me sempre um beijo de boa noite à cabeceira.
A todos os meus familiares, avós, tios e primos que me acompanharam, me confortaram, e me faziam soltar gargalhadas no meio do caos.
Aos meus Amigos que nunca me largaram a mão... As vossas conquistas, a vossa felicidade é minha também porque, afinal, são a família que escolhi!
Ao Pedro, por todo o amor e carinho. Ser-te-ei eternamente grata.
A todos as pessoas que foram mantendo contacto comigo, às que voltaram e ficaram, pelas mensagens, apoio e solidariedade.
A todos os profissionais de saúde, pela sensibilidade, amizade e carinho com que me trataram.


Sem cada um de vós não estaria aqui hoje.


OBRIGADA!




domingo, 1 de janeiro de 2017

Happy new year, Happy new me!

A queda de cabelo na quimioterapia é um dos efeitos secundários que mais impacto tem na auto-estima de qualquer doente oncológico. Por mais que digam "é só cabelo", "depois volta a crescer", a verdade é que é muito difícil lidar com isso, com o cabelo, ou melhor, com a falta dele. Disseram-me muitas vezes "vais ver que isso não é o pior" e tinham razão... às vezes! Houve alturas em que nem me lembrava dele, só queria que alguns dos sintomas passassem rápido, bem rápido! E passavam, mas a carequinha estava sempre lá, brilhante e reluzente, uma espécie de rabinho de bebé, à espera de uma boa ensaboadela pela manhã e do creme hidratante que nunca falhava.

Hoje é o primeiro dia do ano... Deveria, como manda a tradição, estar a dissertar acerca de desejos, sonhos e perspetivas para 2017. Talvez esta minha publicação caia em saco roto, como 99,9% das resoluções que teimamos instituir a cada início de novos anos. Mas ainda assim, achei pertinente abordar, de novo, este assunto.

Precisamente há um ano (lá vem ela com as comemorações!), o meu cabelo começou a cair. Dez dias depois de terminar o primeiro ciclo de quimio, 5 dias antes de iniciar o segundo, para ser mais precisa. Do nada, no primeiro dia do ano, a ficha que ainda não tinha caído, caiu com os primeiros cabelos... Assim, sem piedade, o cabelo revoltou-se e decidiu cortar o mal pela raiz. Caiu, levando com ele os meus desejos, os meus sonhos e perspetivas para 2016. Estes cabelos encaracolados, que tiveram e têm a pretensão de serem lisos, sempre me deram dores de cabeça!

Nunca quis usar uma cabeleira. Sempre me pareceu um pouco artificial (no IPO consigo identificá-las a todas) e acho que me iria custar mais olhar nos olhos das pessoas e saber o que estavam a pensar, que aquele cabelo não era meu. Sou o que sou, aceito-me como sou e não tive culpa absolutamente nenhuma de ter tido um cancro, por isso não tinha nada a temer. Diverti-me bastante a combinar turbantes e a inventar formas diferentes de os colocar - talvez porque não tinha nada de muito interessante para fazer nessa altura! E aos pouquinhos fui aceitando o meu novo visual, deitei o preconceito para trás das costas e saí à rua, tantas vezes quantas o meu corpo permitiu.

Durante a quimio o meu corpo sofreu muitas alterações. Inchei e engordei, caíram-me parte das sobrancelhas e as pestanas... Eu bem tentava pôr rímel, mas tinha três pestanas em cada olho, por muito que me esforçasse, o rímel não era um grande aliado. Fiquei tão diferente que os lenços na cabeça acabavam por equilibrar a minha aparência - traziam alguma cor e vitalidade, além de preenchimento.

Passado um mês de acabar o tratamento estava bem melhor, mais adelgaçada, digamos, mas cabelo que é bom, nada!! Primeiro que crescesse foi uma luta, desesperava todos os dias em frente ao espelho, na esperança de ver um cabelinho, ainda que fraco, a despontar. Mas lá aconteceu e quando cresceu, cresceu com força! Não tive a felicidade de ficar com o cabelo liso (o Marco Paulo teve), mas começou a crescer forte, saudável e, claro, rebelde. Tão rebelde que já levou umas tesouradas e uns pós de perlim-pim-pim para o dominar!


Hoje, um ano depois, olho-me ao espelho e gosto do meu penteado. Aliás, gosto do meu aspeto, muito mais do que gostava antes de ter ficado doente. Sinto-me confiante, muito mais do que antes. Este linfoma tirou-me o cabelo, fez-me trinta por uma linha, mas deu-me uma grande estaleca! 

E porque quando olho para as minhas fotografias, tiradas ao longo deste ano, ainda consigo ficar perplexa com todas as mudanças que aconteceram em mim, decidi cumprir uma das ideias que tive há um ano atrás, documentar/registar essas mesmas mudanças. Por isso fiz este pequeno vídeo (sem música, para não puxar a lágrima) que decidi partilhar com todos aqueles que me foram acompanhando neste ano tão desgastante que foi 2016.





Desejo a todos um excelente 2017!
Tenham esperança, não a deixem morrer nunca, e acreditem que vai tudo correr pelo melhor.
Eu cá acho que o meu ano vai ser delicioso, cheio de desafios e de mudanças, e recuso-me a pensar que o meu corpo me pregará mais alguma partida!

Ah, e não desistam (jamais!) das vossas resoluções de ano novo. Lembrem-se da regra dos 3 F's: Força, Foco e (vale para tudo)!

Sejam felizes :)








sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Oh tempo, não, não voltes para trás!

Um ano de cancro. Sim, faz hoje um ano que me foi diagnosticado o linfoma.

Sempre tive queda para decorar datas (e números de telefone em particular, quem me conhece sabe bem), mas neste último ano esta minha característica acentuou-se. Já há várias semanas que me tem ocorrido pensamentos como "há, precisamente, um ano aconteceu isto, e isto e mais isto!".

Pois bem, há um ano atrás disseram-me: "A Margarida tem um linfoma".
Esta memória pareceu-me ser suficientemente relevante para me fazer voltar a escrever no blog e falar no assunto. Mais do que falar, refletir... Porque a pergunta impõe-se e é inevitável: o que mudou? 

Resposta: Tudo. Mudou tudo. Foi um virar do mundo ao contrário, foi um turbilhão de acontecimentos com muitas emoções à mistura. 

Não foi imediato, a ficha não caiu logo - só assim consigo explicar o facto de ter passado a tarde de 2 de Dezembro de 2015 numa esplanada a conviver com a minha mamã, o mano e alguns bons amigos que se fizeram à estrada para vir entregar um abraço. E depois deste dia, o qual consigo recapitular mentalmente ao pormenor, a ficha demorou a cair... 
Mas quando caiu, bolas, caiu a sério... 

Veio a revolta, tanta revolta! Vieram as dores dilacerantes do cancro que crescia, o tratamento e seus efeitos secundários, as limitações a que fiquei sujeita. Tudo isso gerou mais revolta, mais tristeza, mais dor, como se fosse uma bola de neve! 
Mas, calma, nem tudo foi desgraça... Na verdade saiu-me a sorte grande - o suporte, a estrutura familiar e a rede de amizades que tinha (e tenho), que me impedia (e impede) de ir ao fundo nos momentos mais difíceis, fortaleceu-se, de uma forma tão profunda que não tem preço. 

Sabem aquele jogo de fazer cadeirinha com os braços? Foi mais ou menos assim que funcionou. Sempre que a ameaça de afundar surgia, todos se organizavam, cruzavam os braços, davam as mãos e carregavam-me, levavam-me ao colo... E aos poucos, a confiança voltou a emergir, a esperança, a fé, a aceitação e, por fim, a paz, tomaram conta de mim. 
Acreditei que ia passar, e passou, como tudo na vida.

Mas as marcas ficam e por mais que a vida entre e regresse aos eixos, há sempre alterações no comportamento das pessoas que permanece. Ok, é tudo muito recente, mas os braços e as mãos que formavam a cadeirinha humana continuam cá e, ainda hoje, me amparam as quedas. 
O melhor de tudo é saber que vão permanecer, no matter what. E esta é a parte boa de passar pelas adversidades, pelas provas e rasteiras que a vida nos prega: descobrimos quem são os nossos amigos (com A grande), quem gosta verdadeiramente de nós, quem está e quer, genuinamente, estar ao nosso lado.

A Guida de hoje não é a Guida de há um ano. 
A Guida de hoje é uma mulher confiante, que sabe o que quer e, acima de tudo, o que não quer. 
A Guida de hoje não virou super-mulher, continua a ter, naturalmente, as suas fragilidades... Mas encara-as de forma diferente. 
A Guida de hoje tem dentro dela uma vontade imensa de ir, fazer e acontecer, de dar sem receber, só pelo prazer e satisfação de ser útil ao próximo. 
A Guida de hoje quer sonhar e alcançar, quer descobrir, experimentar, desafiar-se... 
A Guida de hoje quer VIVER, no verdadeiro sentido da palavra, como nunca se atreveu a querer.

Obrigada Sr. Cancro, por me teres acordado para a vida.

Afinal, não és doença, és cura!


domingo, 24 de julho de 2016

O último antes dos 30

Sem pensar muito no calor que se faria sentir hoje, decidi fazer uma caminhada da parte da manhã. Fui até ao Parque verde, local que não prescindo de ir sempre que estou em Coimbra. Ainda não ia a meio e já me arrependia, suponho que às 10 da manhã a temperatura já roçava os 30 graus! Mas nem por isso desisti, é urgente recuperar a forma física, da qual me tenho desleixado nos últimos tempos... 

Cheguei a casa uma hora e tal depois, desidratada e com uma bela dor de cabeça e de pernas! Recuperada do esforço, saio de casa à procura de um sítio calmo para retomar o estudo. Biblioteca, fechada. Faculdade de Economia, fechada. Tentei o TAGV na esperança de encontrar um local, pelo menos, fresco! Não fui feliz na minha escolha, estar dentro do café ou na esplanada da praça teria sido rigorosamente o mesmo. 

Que sorte a minha, um fim de semana de calor infernal, Coimbra deserta (porque está tudo na praia) e a Gui praticamente sozinha em casa e a estudar a esta altura do campeonato!

Se pudesse ao menos recuar uma semana no tempo...  Estava prestes a completar 29 anos!

Não tenho por hábito festejar o meu aniversário com muita gente, gosto muito de convívios e festas, quando são dos outros e por isso quase sempre torço o nariz à ideia de grandes jantares.
Este ano, devido a tudo o que aconteceu, decidi convidar uns amigos para beber um copo e cantar os parabéns à meia noite, nada de especial. 
No entanto, acharam que a ocasião pedia mais, meteram mãos à obra e fizeram, sem o meu conhecimento, o que eu não queria fazer: um grande jantar com a minha família e amigos mais próximos. 

Sem saber de nada ainda lhes dei luta porque insistia em sair da praia, onde estava a passar a tarde com alguns amigos, para ir para Felgueiras onde supostamente jantaria, somente, com os meus pais e avós. 

Os estratagemas para me atrasarem foram mais que muitos e eu não queria, de todo, atrasar-me porque, para além de ser perita nisso, não queria dar razão ao meu pai, que faz sempre questão que eu esteja em casa a horas!

Acho que pela primeira vez na vida, não levei um "puxão de orelhas" pelo meu atraso! 

À minha espera tinha uma pequena multidão, a lançar um "SURPRESA" assim que surgi no patamar. E que surpresa! 




Chorei, tremi, voltei a chorar e dei início à ronda de beijinhos e abraços aos presentes. Seguiu-se uma bela noite de convívio, onde só tive pena de não me poder multiplicar para dar a atenção devida a cada um.

Agradeço aos que vieram de longe, muito longe, para estarem comigo. 
Agradeço aos de perto por terem sido incansáveis nos preparativos e na criação de um cenário incrível. Agradeço, particularmente, à Pi por todo o trabalho que teve ao longo de semanas!
À Tess pelo registo fotográfico que vai virar um excelente álbum.
À minha avó que, atraiçoada tantas vezes pela memória, conseguiu não estragar a surpresa.
Aos meus pais, por terem tornado esta celebração memorável!

Aos poucos (mas bons) que faltaram, pelas mais diversas razões, não se preocupem, estiveram bem pertinho, no meu pensamento.

Para o ano há mais!!



E com este post me despeço do blog por uns tempos. 
Volto em Outubro, darei novidades quando voltar ao IPO. 
Está documentado o que havia para documentar. O pior já passou e desejo, com todas as minhas forças, que os dias difíceis e de luta tenham terminado. 
A resiliência, essa, pode permanecer, é uma boa ferramenta para a vida.


Um bem-haja a todos os que me acompanharam. 
Levo-vos no coração!


segunda-feira, 18 de julho de 2016

Milagre da Vida

Recebi a notícia da gravidez da Valéria (amiga de longa data - tantos anos que já lhes perdi a conta) num dos muitos dias que estive internada nos HUC. As minhas "roommates" já dormiam a sono solto quando fui surpreendida por aquela que foi a bomba do ano: A Val e o Luís Pedro vão ter um bebé!

Saltei da cama, fui para a sala de espera da ala de pneumologia e quis saber todos os pormenores deste acontecimento inesperado. Nessa noite tive dificuldade em adormecer, entre perplexidade e felicidade, a felicidade ganhou e acabei por adormecer com um sorriso nos lábios. É o milagre da vida, um bebé só pode significar e despoletar sentimentos positivos!



O tempo foi passando, obtive um diagnóstico, iniciei a quimioterapia... Nos intervalos dos tratamentos, saíamos para lanchar, para partilhar novidades. Foi um período de descobertas, de reflexões, de amadurecimento, de troca de ideias, de projeções para o futuro. O melhor destes encontros era poder ver a barriguinha da Val cada vez maior, era tocar-lhe e sentir o Luisinho mexer-se, era vê-la cada vez mais bonita e, acima de tudo, feliz.



O Luisinho deveria ter nascido no final de Junho. Mas o pequenote estava com preguiça e nunca mais nos dava o gosto de nascer. A certa altura a Val comenta comigo: "Guida, ficamos a saber da existência dele quando ficaste doente. Com jeitinho vai nascer no dia em que acabas os tratamentos!". Era ouro sobre azul! 

No dia em que acabei a radioterapia combinamos jantar com os nossos amigos para assistirmos juntos ao jogo da seleção e celebrar a minha vitória. Assim que cheguei ao restaurante encontrei a minha Val nervosa, rodeada de leques improvisados, e de saída para o hospital. O Luisinho ia nascer! E nasceu, na madrugada de 7 de Julho. Saudável, perfeito, com um narizinho a puxar o do pai! 

O meu dia tinha sido maravilhoso e não poderia ter tido um final mais feliz!
Apresento-vos o menino mais querido à face da terra, o nosso pequeno Luisinho!


Não me canso de contempla-lo e acredito que estou a desenvolver as minhas skills de tia emprestada. O que vem mesmo a calhar porque em breve vou ser tia pela segunda vez, já que a Sílvia está à espera de uma menina!

A Maria nasce em Novembro e estamos desejosos para a conhecer (desconfiamos que se o nariz do Luisinho é igual ao do pai, o nariz da Maria vai ser igual ao da mãe)


No início deste ano disseram-me que 2016 ia ser um grande ano para todos nós.

E não é que está a ser?