A prova de que, realmente, ando a falhar com este blog é o
facto de estar em frente ao computador há uns bons minutos à procura das
palavras certas para começar este post. Por não me querer tornar repetitiva as
palavras custam a sair. Costumam dizer que o difícil é começar. E com isto já
escrevi umas linhas.
Há duas razões essenciais pelas quais tenho estado ausente.
A primeira é que não tem havido grande evolução no meu tratamento.
No início
desta semana fui ao IPO fazer uma biópsia. Aquela que era a solução menos
provável concretizou-se. Antes de fazerem opções erradas, os médicos decidiram
que seria mais sensato tentar chegar ao cerne da questão, à massa de células
que permaneceu após a quimioterapia, retirar uma amostra e estuda-la. Uma vez
que eu não apresentava sinais clínicos da doença, o objetivo desta biopsia
alterou-se: o resultado dela vai servir para ajustar a dose da radioterapia, sendo que
a hipótese de voltar à quimioterapia é, praticamente, remota (ainda que não
tenha saído da mesa por completo).
Segundo a Dra Ilídia, a quimio já fez o que
tinha a fazer. O que restou há-de ser eliminado pela radioterapia. Posto isto, e bastante contrariada, lá fui
fazer o exame. Antes de assinar o papelinho, coisa que só acontece quando os
procedimentos apresentam alguns riscos, pedi, encarecidamente, por uma
anestesia para além da anestesia local, qualquer coisa que me pusesse a dormir.
Sob pena de ter de fazer a biopsia noutro dia lá aceitei um comprimido para me
ajudar a relaxar e fiz a biopsia bem acordada! Bastou-me olhar para o tabuleiro
dos instrumentos do médico para ficar uma pilha, aquela agulha tem um tamanho
assustador. E pensar que vai ser espetada no peito é aterrador!
Ao fim de 20
minutos estava já na maca, a receber paracetamol diretamente na veia para não ter dores
quando a anestesia local passasse e a chorar como uma Madalena arrependida. Duas horas de
repouso, um raio-x ao tórax e fujo, a 7 pés, daqueles carniceiros!
Não foi tão
mau como da outra vez, é certo, mas espero, fervorosamente, que tenha sido a
última!
Fui embora com a indicação de repousar, nada de esforços até
ao dia seguinte. Depois é fazer a vida
normal. E foi o que eu fiz. A partir daí resolvi praticar o “vá para fora cá
dentro” com alguma intensidade e esta é a segunda e verdadeira razão pela qual
não pus cá os pés.
Do Porto segui para Vila do Conde e de lá para Lisboa. No
regresso ao Norte decidi fazer uma visita relâmpago a Coimbra... É mais forte
do que eu!
A minha casa, as minhas colegas de casa (mais amigas que colegas),
receberam-me de braços abertos como sempre. A mim e à minha tropa! E lá fomos
cumprir a tradição, com chuva ou sem chuva, estudante que é estudante não falha
uma queima das fitas!
A esta altura devem achar que sou doida, mas a verdade é que me
sinto ótima, com as energias lá no alto. E, não havendo nenhuma restrição
médica, não havia razão para não ir, se era essa a minha vontade. Revi muitos
amigos, choveram abraços e algumas lágrimas de alegria de ambas as partes. Em
menos de 24 horas estava a bordo de mais um autocarro, desta vez em direção ao
Porto. De coração apertado, porque soube a pouco, mas de alma cheia, porque
voltar a Coimbra é sempre um gosto. Reconheço que já chega de queimas... Mas
voltar também foi bom por isso, para me dar essa percepção.
Chego ao Porto debaixo de uma chuva que não dava tréguas e
sigo com a Pi em direção a Vila Real. Fomos festejar o “último dos vintes” da minha
amiga Raquel, e rever os nossos amigos transmontanos, que conhecemos, claro
está, em Coimbra! Na volta, o túnel do Marão abriu alas para a nossa passagem,
cruzamo-nos com a comitiva do governo e dissemos adeus ao Sócrates... Vá, agora estou a inventar!
A azáfama de viagens terminou, ufa!
Volto à base mas tenho o pensamento noutra cidade e no
passado, num tempo que foi e não volta. O meu facebook foi invadido
por estudantes que se recusam a adiar cortejos académicos devido às condições
meteorológicas. Era minha vontade ir ao sótão, sacudir o pó ao traje e sair
para as ruas de Coimbra, de cartola roxa e bengala em punho. Afinal sempre foi
o curso que quis fazer e era suposto terminá-lo agora. Por alguma razão, que só
alguma entidade divina será conhecedora, não foi assim que aconteceu.
E hoje,
numa vila junto ao mar, bem longe de Coimbra, sou invadida por uma nostalgia,
uma mágoa, uma revolta e muitas incertezas. Mas deixo que a maresia e o mar
revolto me levem esses sentimentos para bem longe. Aceito o que a vida me deu e convenço-me que o
futuro me trará a recompensa.
Já diz a música, "hoje é o primeiro dia do
resto da tua vida". Está na hora de assentar arraiais, planear o estudo e
trabalhar no que está ao ao meu alcance para continuar o meu percurso. Hoje,
junto ao mar, decidi que não vou só vencer o cancro, mas vou também vencer na
vida.
Lamechices à parte, digo-vos, “um dia ainda me vou rir disto”!